Câmara Municipal de Lagoa Formosa

Notícias

30/01/2007

O QUE DEVERIAM ENSINAR ÀS ESCOLAS - PARTE 1

As formas dão forma ao nosso mundo
Um computador é capaz de armazenar em sua memória, todo conhecimento da humanidade, e desse modo, pode transmitir às futuras gerações, tudo que está lá guardado, e tudo isso, sem a interferência do ser humano. A partir do momento que os educadores se tornam meros transmissores do conhecimento, seu maior rival sem dúvida será uma máquina dessas e não os outros professores. A máquina tem algumas vantagens sobre o professor.
Esta pode trabalhar muitas horas por dia, todos os dias da semana e feriados, sem reclamar de cansaço, sem folgas, sem reivindicar nada para si. Em segundos será capaz de absorver as últimas novidades e descobertas cientificas, sem a necessidade de participar de caros congressos de atualização, sem necessidade de reciclar-se profissionalmente para exercer novos cargos, sem a necessidade de aposentar-se por tempo de serviço. Não precisa de tempo algum para se preparar para mais um dia de trabalho, basta que apertem um botão e ele já está pronto, como se fosse seu primeiro dia naquela ocupação. Para a escola será muito mais vantajoso, e então o que será feito do educador formado na arte de transmitir conhecimentos, que é o modelo tradicional que conhecemos hoje?

Podemos observar como nos sentimos importantes quando nos identificamos com alguma coisa grande. Pode ser uma instituição poderosa, alguém influente, uma idéia defendida por muitos, um produto da moda. Ao nos identificarmos com alguma idéia, ideologia, estilo de vida, ou o que seja, estamos na verdade fugindo da nossa realidade em busca de um mundo de sonhos, estamos renunciando aquilo que somos e criando um personagem que gostaríamos de ser, uma situação irreal que passamos a perseguir para fugir da feiúra que julgamos ser nossa existência. O certo é que nunca encontraremos um modelo ideal, uma vez que perseguimos sempre os objetivos que os outros nos apontam, que até pode servir para eles, mas logo se revelam ou inatingíveis ou não adequados para nós.
Ser educado para nós é a adquirir conhecimentos, e mais algumas regras de como devemos nos comportar no trato diário como as pessoas. Isso para nós é suficiente, uma vez que nos torna aptos a exercer um cargo no mercado de trabalho, e ter suficiência para que os outros entendem o que falamos, e nós também sejamos capazes de entender o que dizem. Estamos mecanicamente seguindo as normas que dizem como devemos nos relacionar com as pessoas, em nosso trabalho e cotidiano, sempre respeitando às diversas hierarquias, interesses nossos, e da corporação que representamos. Estabelece-se assim um convívio irreal entre pessoas e facções, onde a tolerância é apenas um jogo cenográfico onde todos representam, e onde a relação só é possível porque existem os interesses materiais de cada uma das partes.

Num cenário assim, não precisamos nos envolver com ninguém, apenas fingirmos algum interesse por um período de tempo relativamente curto, conforme o padrão estabelecido pelo meio social ou corporativo, com suas normas e convenções. E isso, pela própria natureza da coisa, se torna uma prática artificial, é como se estivéssemos representando um papel. As regras se prestam a guiar nossos passos, orientando como devemos agir e nos comportar nas mais diversas situações do nosso dia a dia. Assim, é necessário apenas que saibamos fingir um pouco, e já saberemos como nos relacionar com as pessoas. O artificialismo é permitido, pois ninguém está interessado em relações duradouras, apenas o tempo suficiente para conseguir seus objetivos. Por isso mesmo valorizamos tanto a aparência das coisas, isso é essencial quando queremos causar boa impressão, mesmo que a realidade nunca seja aquela demonstrada. Criamos a aparência ideal porque todos fazem a mesma coisa, e assim nos relacionamos com imagens ideais, fantasias criadas com o único propósito de esconder do mundo aquilo que somos de verdade.

A cortesia nas relações se torna então uma mera representação teatral, uma formalidade calculada, sem emotividade alguma, uma forma padrão de comportamento, que pode ser devidamente ajustada para se adequar a qualquer situação. Embora artificial, tal comportamento é aceito por todos, e caso não existisse, poderia até causar mais confusão e desordem em nosso mundo. Assim, o fingimento é necessário para por ordem em nossas relações, e para a correta organização das nossas instituições. Desse modo podemos afirmar que a mentira se torna uma habilidade necessária ao correto funcionamento da sociedade como hoje a conhecemos. Mentimos porque queremos agradar, queremos agradar porque temos interesses pessoais envolvidos, e todos fazem a mesma coisa, logo, nossas verdades se tornam grandes mentiras, um mundo absolutamente falso, onde nada é o que aparenta ser.

Eis o modelo de mundo que nossos filhos herdarão, pessoas que agem e se relacionam de forma mecânica, como a seguir uma programação. Autômatos repetindo frases e comportamentos padronizados para cada situação do dia a dia, um ser artificial, vivendo superficialmente, sem sentimento algum, onde o desejo de ser importante é sua obsessão, como uma máquina seguindo o padrão operacional que um operador escolhe, conforme a necessidade do dia na linha de produção.

Ao agir como uma máquina que apenas repete padrões de comportamento, rapidamente o homem perde seus valores humanos e simplesmente se deixa levar pelas influências do mundo à sua volta. Suas idéias e objetivos, os outros determinam, assim como os meios necessários para que ele seja capaz de alcançar cada uma dessas coisas. Os meios de consumos e os senhores que cuidam do seu modo de pensar e agir, dirão a que horas deverão dormir e acordar, o que deverão comer e vestir em cada ocasião, quais suas obrigações com trabalho, família e amigos. Dirão até como eles devem se relacionar com os filhos e esposa ou marido. Um objeto controlável de acordo com as conveniências das facções e vertentes, encarregadas de controlar a vontade e o querer humano. Cria-se assim o ser humano objeto, completamente controlável, Absolutamente a mercê dos meios dominantes, que se encarregarão de direcionar cada ser de acordo com sua proposta de momento, conforme seus interesses. Controlam seus sentimentos, seus sonhos, suas crenças, pelo domínio do medo. É como a criança obediente que recebe presentes por bom comportamento, mas sabe que se não seguir as regras será castigada.

Assim, podem fazer o homem rir e chorar, podem torná-lo dócil ou hostil, podem torná-lo emotivo ou insensível, podem transformá-lo numa máquina de matar e destruir ou de construir coisas fantásticas. Dotados de uma crueldade sem par, os senhores do controle do homem, percebendo que estes careciam de algum conforto além do material, criaram para eles, a idéia de paraísos além da vida, uma forma conveniente de aquietá-los em suas tentativas de insurreições contra a miséria onde viviam. Assim o conformismo se torna aceitável a até uma prática instituída e aperfeiçoada ao longo do tempo pelas correntes sectárias.

Por que deve o homem aceitar seu destino de sofrimentos e angústias, seu eterno vazio interior carente de respostas coerentes, respostas que digam exatamente qual o seu verdadeiro papel nesse mundo, não o papel que as instituições criaram para cada um, mas o verdadeiro propósito da vida humana? Como nos impressionam as grandes fachadas das modernas instituições, com seus mármores e a espetacular plasticidade de suas formas, com sua limpeza e belos jardins, com seus funcionários bem vestidos e sempre sorridentes, com sua ostentação de poder e longevidade. Isso nos impressiona porque também desejamos o mesmo para nós, fomos programados para pensar assim, para viver assim, apenas nunca nos ensinaram com lidar com o fracasso, como devemos nos comportar se não conseguirmos. Um ser homem verdadeiramente humano, ainda está por surgir, mas nunca antes que esteja consciente daquilo que atualmente é, e de como o meio social controlador de seus destinos, vontades e sentimentos, é o verdadeiro responsável por toda miséria e caos que vive a humanidade.

Cada criança tem tendências, aptidões, e dificuldades peculiares, que podemos chamar de um perfil personalizado, e outras até podem ter um perfil semelhante, mas nunca igual. Compreender essa regra básica capacita o pai ou educador a iniciar seu aprendizado no relacionamento com a mesma. Na verdade, não precisaríamos de modelos institucionais que nos ensinassem como ser virtuosos ou éticos, pois sendo sensatos, saberíamos como tratar a todos da forma adequada, pois receberiam de nós, aquilo que gostaríamos de receber deles. Se desejamos para nossos filhos uma nova realidade diferente dessa, urge conhecermos nossas fraquezas e acomodações pessoais, nossos medos que nos obrigam a seguir padrões, e apenas assim seremos livres para criar indivíduos livres, indivíduos que saberão pensar por si mesmos, e não de conformidade com os ideais de uma máquina criada para dizer como devemos pensar, e no que devemos pensar.
Autora: Ester Cartago